Conhecer sempre! Isso vos libertará. |
E mais,
instituía a crença em um enviado divino que instauraria a justiça, mas como um
imperador centralizador e hierárquico, numa salvação coletiva. Essa salvação
seria infindável no céu para os eleitos, o restante sofreria as penas eternas
do inferno. Deste modo, a Igreja negava a hipótese, gnóstica, do progresso
individual pelo desenvolvimento dos potenciais da alma no decorrer das
reencarnações.
O Espiritismo vem restaurar a
gnose, ou o conhecimento original do Cristianismo. Segundo os Espíritos, isso
trará uma condenação pela Igreja. “O clero gritará: heresia; porque verá que
atacas decisivamente as penas eternas e outros pontos sobre os quais ele baseia
a sua influência e o seu crédito. O anátema secreto se tornará oficial e os
espíritas serão repelidos, como o foram os judeus e os pagãos, pela Igreja
Romana”, anteveram eles em Obras Póstumas, de Allan Kardec.
Para Kardec, muitos trechos
dos Evangelhos foram deturpados, alterados e suprimidos no decorrer dos
séculos. Contudo, por mais que essas distorções ocorressem, o Novo Testamento
era a única alternativa para conhecer a vida de Jesus. “Nenhum documento mais
existe, além dos Evangelhos, sobre a vida e a doutrina de Jesus. Aí somente é
que se há de procurar a chave do problema. Todos os escritos posteriores, sem
exclusão dos de Paulo, são apenas, e não podem deixar de ser, simples
comentários ou apreciações, reflexos de opiniões pessoais, muitas vezes
contraditórias, que, em caso algum, poderiam ter a autoridade da narrativa dos
que receberam diretamente do Mestre as instruções. Sobre todos os dogmas, em
geral, o acordo entre os pais da Igreja e outros escritores sacros não seria de
invocar-se como argumento preponderante, nem como prova irrecusável a favor da
opinião de uns e outros, uma vez que nenhum deles citou um só fato, fora do
Evangelho, concernente a Jesus; que nenhum deles descobriu documentos novos que
seus predecessores desconhecessem”, explica Kardec em Obras Póstumas.
Uma
descoberta revolucionária
Portanto, de acordo com Kardec
não havia um só documento que comprovasse os conceitos impostos pela Igreja.
Mas o clero também alega que não há documentos originais do gnosticismo. Quase
cem anos depois, porém, uma descoberta arqueológica iria mudar o rumo da
história: os papiros de Nag Hammadi. No deserto do Egito foram encontrados
pergaminhos que reproduziam textos escritos pelos cristãos primitivos: eles
confirmam a versão gnóstica do Cristianismo. Essa descoberta comprova a ligação
entre os ensinamentos originais de Jesus e a Doutrina Espírita: “O Espiritismo
é a Terceira Revelação da lei de Deus. Nada ensina em contrário ao que ensinou
o Cristo; mas, desenvolve, completa e explica, em termos claros e para toda
gente, o que foi dito apenas sob forma alegórica. Ele é, pois, obra do Cristo”,
afirmou Kardec em O Evangelho Segundo o Espiritismo.
Os textos gnósticos, escritos
há quase 2.000 anos, foram descobertos em 1945, próximo à cidade de Nag Hammadi
no Egito. E em 1977, finalmente, o conjunto completo dos 52 textos encontrados
chegou às livrarias. Os papiros fizeram renascer os Evangelhos gnósticos quando
a Igreja os imaginava um assunto enterrado e esquecido num passado longínquo.
Como a ave mitológica fênix, a suposta heresia renasceu das cinzas.
A
Igreja está atordoada
Foi uma descoberta
evolucionária. Os manuscritos, dizem os testes científicos, são do século 4º,
mas reproduzem textos criados entre os anos 50 e 150. Datam de quando viviam
discípulos diretos de Jesus. Ou seja, alguns são até mais antigos que a versão
atual dos quatro Evangelhos adotados pela Igreja: Marcos, Mateus, Lucas e João.
Os cristãos têm agora, além do Novo Testamento, novos e autênticos textos sobre
Jesus e seus ensinamentos.
Essa descoberta teve uma
estrondosa repercussão na Igreja. Mas, para o público, finge apatia e
desinteresse. Curiosamente, a reunião entre os dirigentes da Igreja, conhecidas
como Concílio, convocada em 1962, fez uma defesa intransigente da aceitação
única e exclusiva dos Evangelhos bíblicos: “A santa mãe Igreja defendeu e
defende firme e constantemente que estes quatro Evangelhos, cuja historicidade
afirma sem hesitação, transmitem fielmente as coisas que Jesus, Filho de Deus,
durante a sua vida terrena, realmente operou e ensinou para salvação eterna dos
homens, até ao dia em que subiu ao céu”.
Mas essa negação radical não
foi unânime, muitos católicos de todo o mundo se interessaram pelos documentos
resgatados. O Evangelho de Tomé chegou a ser citado pelo papa João Paulo I, um
estudioso da gnose, uma semana antes de sua morte.
Os Evangelhos gnósticos –
escritos, entre outros, por Tomé, Pedro, Tiago, Maria Madalena, Felipe, e até
Valentino –, juntamente com diversas cartas também encontradas em Nag Hammadi,
resgatam fatos e ensinamentos ausentes no Novo Testamento e reforçam a surpreendente
similaridade dos conceitos cristãos dos primeiros séculos com a Doutrina
Espírita. Infelizmente, Allan Kardec não pôde conhecê-los em sua época para
usá-los em sua releitura do Evangelho.
Jesus
ensinou a reencarnação
Por exemplo, o conceito da
reencarnação, fundamental no Espiritismo, está muito evidente no Evangelho de
Valentino, quando Maria Madalena pergunta a Jesus sobre o lugar das almas antes
delas virem ao mundo. Nessa passagem, ela queria saber como foi a preparação
espiritual para a vinda de Jesus, e ele explicou:
“Tomei
Elias e o enviei ao corpo de João, o Batista. E enviei outros a corpos justos,
para que encontrem os mistérios da luz, e se elevem às regiões superioras, e
entrem na posse do reino da luz” (Valentino, 60:5-6).
O significado dessa passagem é
muito evidente. Sem equívoco, figura ou discussão: Elias voltar ao corpo físico
é simplesmente reencarnar. Além disso, os versículos seguintes deixam claro que
o reino divino se dará quando os homens conquistarem a sabedoria, vida após
vida.
Kardec considerava de
fundamental importância a constatação da existência da reencarnação entre os
ensinamentos de Jesus: “Negar a reencarnação é negar as palavras de Cristo. Um
dia, porém, suas palavras, quando forem meditadas sem ideais preconcebidas,
reconhecer-se-ão autorizadas quanto a esse ponto, bem como em relação a muitos
outros. Sem o princípio da preexistência da alma e da pluralidade das
existências, são ininteligíveis, em sua maioria, as máximas do Evangelho, razão
por que hão dado lugar a tão contraditórias interpretações. Está nesse
princípio a chave que lhes restituirá o sentido verdadeiro”, conforme explicou
em O Evangelho Segundo o Espiritismo.
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